sábado, 13 de setembro de 2014

Carlos em Buenos Aires - Dia 4: Cementerio de la Recoleta

Eu tive a oportunidade de conhecer Buenos Aires entre o final de julho e o comecito de agosto. Foi uma das viagens mais repentinas que já fiz, porque recebi o convite da grande Emely pra ir numa segunda-feira, e sexta-feira de noite já estava na rodoviária de Paso de los Libres embarcando para a Big Apple. Claro, nada supera a vez que cheguei de Uruguaiana em casa, e recebi o convite para ir até o Paraná na madrugada seguinte, mas esse não é o ponto.

Bom, eu tive uma experiência magnífica na capital argentina. E, embora ninguém além da minha vó tenha solicitado (a mãe prefere perguntar detalhe por detalhe do que ver um resumão), quero compartilhar o que vi e vivi por lá. E, como autêntico indivíduo com déficit de atenção, que lê jornal de trás pra frente, meu diário começa pelo último ponto turístico que visitei por lá com a Emely. Éramos Thelma & Louise de São Sebastião do Caí, correndo as trança por essa latinoamérica que tanto amamos.

Começando pelo fim, ainda mais por um cemitério, tem sua simbologia pieguíssima. Com vocês, o cemitério de la Recoleta.




O cemitério de la Recoleta é um dos lugares mais inacreditáveis que já coloquei esse pé 44.  Sempre dizem que é um museu a céu aberto, mas é impossível ter ideia da magnitude que isso representa sem se perder lá dentro.



Muitos mausoléus têm apenas grades, o que deixa os caixões expostos. Tu olha ao redor e perde de vista a quantidade de esquifes gastos pela ação do tempo. O que para muitos pode ser amedrontador ou macabro, para mim era carregado de história. Meu único medo lá dentro era derrubar o celular dentro de uma cripta. E havia essa possibilidade.


 Todo mundo que vai procura o mausoléu da Eva Perón, e é lógico que nós fomos atrás. É uma construção esteticamente simplória se comparada a outras lá dentro, mas ainda assim é algo que te derruba um pouco. Ali descansa, depois de muito passeio, o corpo embalsamado de uma das mulheres mais poderosas da história da civilização. Entre as placas metálicas em memória da Evita, a pedra negra do mausoléu, as flores enroscadas na grade...

Cheguei perto para ver o que tinha dentro, colando meu rosto na grade e na porta de vidro por trás, e, em um momento tão poético que chega a ser ridiculamente piegas, o cheiro doce das flores tomou meu nariz. E aí sim eu fiquei bambo, porque ser tomado por aquele aroma naquela circunstância foi indescritível.


O túmulo recém-inaugurado do Raúl Alfonsín, todo branco e com um busto do ex-presidente, também é uma obra muito bonita.

Contudo, os túmulos dos ilustres desconhecidos são os mais deslumbrantes. Não tem como não ficar impressionado com a escultura de uma mãe deitada com o filho bebê em um colchão tão bem-feito que parece ser verdadeiro, por exemplo. Bustos, estátuas de corpo inteiro, retratos, rostos esculpidos nas placas de ferro... nenhum com aquele olhar “estou te julgando” de outros cemitérios. Na Recoleta, parece que sentem orgulho de serem admirados. Mortos soberbos.



Em um ou outro portão de mausoléu, encontrei o bom e velho símbolo da caveira com dois ossos em cruz por trás. Sem dúvida, uma das cerejas no bolo tétrico que é a Recoleta.


Quando saíamos do cemitério, uma senhora poliglota e extremamente simpática apareceu flutuando vestida de noiva e gritando ayuuuuuuuudaaaaaameeeeeeeee vendendo o mapa do local. “Good afternoon! Where are you from?” “Brasil” “Ah, que maravilha!”. Comprei um mapa, e ela prontamente começou a nos explicar por onde deveríamos começar o trajeto lá dentro. Explicamos que já estávamos de salida, e ela, com um sorriso largo, nos desejou boa tarde e um retorno, algum dia. E, sem sombra de dúvida, la Recoleta é um lugar que é necessário retornar e passar um dia inteiro explorando cada tabuleta de mármore.
Ou uma noite. Com uma lanterna, um grupo de amigos, um tango instrumental ao fundo e uma quantidade enorme de empanadas e Fernet com Coca. La Buenos Aires de los muertos é tão majestosa quanto la Buenos Aires de los vivos.



Dica de bons modos: tirar fotos na Recoleta é quase obrigatório. Entretanto, se tu for aparecer nela, toma cuidado com o sorriso que tu vai abrir. É um cemitério, fica chato sorrir demais.